sábado, 11 de setembro de 2010

Calçadas Ensanguentadas

Esse meu novo conto deu trabalho. Quando comecei a escrevê-lo achei tive muitas dificuldades, por que escrevi só no impulso de escrever qualquer coisa. Só então eu parei e pensei melhor, mudei algumas coisas e decidi como prosseguir. Ele fala sobre passado, futuro e tem muito, muito sangue. Ah, boa parte dele acontece em calçadas também (não que isso seja lá muito importante).
Leia-o e veja o que acha!


Calçadas Ensanguentadas

        O homem estava parado em uma calçada, ou melhor, ele estava jogado nela. Se escorava contra um muro velho e desgastado, enquanto contemplava o movimento na avenida com seus olhos vorazes por comida. Com seu capuz azul-escuro e sua calça jeans rasgada, ambos sujos e em trapos, qualquer um poderia pensar que se tratava de um mendigo ou de um homem perdido na vida. Na verdade, ninguém chegava nem perto de adivinhar quem era aquele homem.
        E assim, o sol foi nascendo mais uma vez.
        Na Escola Estadual de Ensino Médio Presidente Juárez Celman, as aulas começavam sempre cedo, muito mais do que nas outras da região. Mesmo os alunos que moravam mais perto tinham de levantar ao raiar do sol nos tempos de inverno, como era o caso. Andando por uma calçada, três estudantes caminhavam alegremente e conversavam alto, passando pelo homem sem nem mesmo notar sua presença. Claro, é um comportamento comum entre grande parte dos jovens das cidades grandes de hoje em dia simplesmente ignorar esse tipo de pessoa. Mas mesmo assim, fica a dúvida: talvez, apenas talvez, se eles tivessem notado a sua presença, não teriam sido mortos naquela manhã fria de Julho. Uma morte brutal, que apareceria no noticiário por dias, causando revolta e tristeza em todo o país. “Mais de trezentas mortes em um colégio de ensino médio da rede pública foram registradas pela Polícia Militar hoje à tarde”, diria a mulher no jornal das oito.
        Suas famílias não ficariam desoladas com as mortes e passeatas não seriam feitas por meses, pedindo maior seguranças nas escolas. Trezentas vidas jogadas fora por causa da desatenção de três jovens? Talvez, isso é algo muito difícil de se saber, já que nunca aconteceria, pois agora, eles já estavam duas quadras longe dele.
        Certo, aqueles mais informados nunca colocariam em crianças indefesas a culpa de suas mortes e sim nas mãos de Juan Oliveira. Ele sim tinha falhado miseravelmente daquela vez. Não haviam desculpas, era uma falha simples e total. Mas tudo isso ainda não aconteceu. Ainda era um futuro a ser escrito. E somente Juan poderia dizer se ele iria se concretizar ou não.
        Juan acordou, suando frio. Estava em um velho apartamento na zona sul, de duas peças, um quarto minúsculo e feio, e uma sala e cozinha, onde o homem tomava café.
        Então o prazo era hoje. Se não conseguisse... Não queria nem pensar nisso... Trezentas pessoas mortas, talvez até mais. Nunca amaldiçoou tanto sua capacidade de clarividência quanto hoje. Mesmo não estando curado do embate do dia anterior, levantou-se lentamente da cama e dirigiu-se ao banheiro. Lá tomou banho e escovou os dentes, atividades banais que nunca lhe causaram desconforto algum antes, mas que hoje ele fazia a duras penas, com muitas dores lombares e no braço esquerdo.
        Era como Daniela tinha lhe dito semana passada: “Você já tem quarenta e dois anos, Juan, é hora de parar com esse trabalho perigoso”. Mas ele não ligava, sabia que só iria parar quando estivesse morto. Afinal, desde sua mais antiga lembrança, ele já trabalhava naquilo, e quando olhava para o futuro, só via sangue e morte. Em outras palavras, seu trabalho continuava.
        O seu café da manhã foram algumas torradas queimadas e leite, suficiente para um longo dia de trabalho, ele gostava de dizer. Mal conseguiu comer, pensando no que seria do seu dia se ele falhasse mais uma vez. No dia anterior tinha perdido a batalha por pouco, sendo atropelado por uma van no momento mais crítico. Não sabia se fora sortudo ou azarado nesse momento, pois na velocidade que vinha o carro, ele poderia facilmente ter morrido.
        Comeu pouco, pois as imagens dos alunos da escola mortos lhe tiravam o apetite. Voltando ao seu quarto, pegou um revólver velho, duas pistolas e uma espingarda de cano serrado, esse era seu arsenal. Seus superiores ofereciam armas tecnológicas e cheias de frescura, mas como homem simples e rude que era, ele nunca as aceitava. Quando tinha tudo guardado em seus respectivos lugares, pegou um lenço vermelho e amarrou ao pulso, pensando em David, aquilo lhe daria forças para seguir em frente.
        Vinte anos de serviço e nenhum reconhecimento, mas dane-se, Juan não buscava reconhecimento nem fama, queria somente eliminar o mal e salvar pessoas. Ele tinha um poder. Um poder que poucos tinham nesse mundo e também técnica e uma sorte que nunca lhe deixou na mão. Queria que isso fosse suficiente para impedir a tragédia que aconteceria durante a tarde, mas sabia que não seria. Na verdade, ele tinha um forte pressentimento de que morreria hoje, na luta contra ele. Claro, se ele morresse salvando a todos, sua vida teria tido significado, mas se caísse em vão, perante as garras do inimigo incerto, a derrota lhe doeria fundo na alma.
        Pegou o carro e saiu com ele, tendo somente um destino: a Escola Presidente Juárez Celman.
Na calçada, o outro homem ainda esperava. Seu sangue fervia e a fome era cada vez maior, mas ele se segurava, pois naquele corpo infectado ainda existia alguma consciência, perdida em dor e no instinto animal que agora lhe guiava. Na verdade, só o que fazia essa pequena força de vontade existir, era o fato de que o momento certo ainda não tinha chegado, pois a transformação ainda estava em curso.
        Pouco mais de sete quilômetros dali, em um bairro vizinho, Juan saía de carro, pensando na mesma coisa que o homem da calçada: quando seria o próximo ataque. Pensando nisso, envergonhou-se, pois já fazia uma semana que estava nesta caçada estúpida e mesmo assim, a melhor chance que tivera de derrotar (não, matar) aquela coisa fora interrompida pelo acidente com a van no dia anterior. Segundo as informações que Daniela tinha lhe passado, a criatura já estaria chegando ao final da etapa de transformação agora, e a qualquer minuto, aquela aberração iria matar.
        Sangue. Carteiras escolares cheias de tripas e sangue.
        O caçador quase bateu o carro com a vertigem que teve ao visualizar a cena. Parou-o e saiu, pois aquilo tinha lhe causado ânsia de vômito. Pior do que ver um futuro desses, era saber que ele só aconteceria porque ele falharia em sua missão. Tudo que lhe pediam era para cuidar de mais um problema simples, e ele, tolo e incapaz, nem isso conseguiria. Sentado sobre a calçada suja, Juan pensou no homem, e o homem pensou nele.
        Um cachorrinho passava na frente de homem em crise, que lutava para existir, quando sua vontade maior era simplesmente desistir e ser levado pela fome, esquecer as angústias da humanidade, a vida dura e sofrida e somente ter o prazer de se sentir vivo novamente, guiado pela besta interior. Por um segundo, o homem perdeu a batalha, e o cachorro perdeu a vida, restando dele somente uma poça viscosa vermelha e cheia de pelos.
        Do outro lado, o tempo corria, mas o caçador, que era profissional, porém ainda assim humano, não conseguia levantar da calçada fria. As imagens e o fracasso eminente lhe bloqueavam os pensamentos, e ele só via o tempo passar, incapaz de vencer aquela guerra consigo mesmo pra levantar e encarar seus deveres de frente.
        Eram muito parecidos, os dois homens. Ambos estavam ficando velhos e cansados. Nem tanto em idade, já que ambos estavam eram quarentões, mas sim e fé e esperança. Nenhum deles conseguia ver dias melhores pela frente, mesmo que um pudesse ver relances do futuro. Ambos estavam instáveis, perdendo a batalha interior contra eles mesmos, fatigados demais para seguir em frente. Mas ambos sabiam uma coisa: ao final daquele dia, somente um deles se sairia vitorioso.
        Como se tivessem uma ligação mágica entre si, os dois levantaram um em cada calçada ao mesmo tempo, mas por motivos totalmente diferentes. Enquanto o caçador levantou temeroso, mas decidido em fazer daquele dia algo diferente do que suas visões lhe diziam, o outro levantou inconsciente, movido pelo desejo e pela fome. E assim o inevitável embate se aproximava cada vez mais...
        Juan ligou o carro e acelerou o máximo que pôde, tentando chegar na escola o quanto antes pudesse. Para aliviar um pouco da tensão, decidiu ligar o rádio, onde tocava Highway to Hell, do AC/DC, muito apropriado para o momento. Não pela música em si, já que ele não entendia uma palavra em inglês, mas por lembrar-lo de seu antigo parceiro na luta contra o mal (ou assim ele gostava de acreditar, não foram poucas as vezes que se perguntou o que realmente estava fazendo, e se aquilo traria algum bem a alguém que não seus superiores). Olhou para o lenço vermelho em seu pulso e sorriu, ainda sentia saudades daquele maldito americano.
        David chegou na base falando com um sotaque todo atrapalhado e era todo desajeitado. Mas logo Juan notou que aquele cara era um amigo de verdade, no mesmo dia em que começaram a trabalhar juntos. Mesmo com todo um discurso tedioso sobre patriotismo e criação de gado (como se de alguma forma, os dois estivessem ligados), ele se atirou na frente de uma bala para salvar seu parceiro, um homem com quem ele não tinha convivido nem três horas sequer.
        Ainda assim, sobreviveu e foram seis anos de companheirismo, amizade e diversão. Porque quando David estava junto, até o mais difícil dos trabalhos parecia ser divertido e leve. Ele sempre usando aquele chapéu de cowboy e o lenço vermelho. Não era um homem de bom gosto, isso era certeza, mas era um cara com um grande coração.
        Uma vez o caçador viu uma frase num filme da qual ele lembrou muito nos últimos três meses, que haviam sido um poço de solidão para ele: “Tudo acaba um dia”. No caso, a frase tinha sido usada para consolar uma viúva que tinha perdido o marido, mas também se aplicava muito bem na vida dele. Depois da morte do amigo, uma fase feliz de sua vida tinha acabado. E agora, ele ainda tinha essa missão desgraçada, cujo inimigo era algo que ele nunca tinha visto antes. Precisava se concentrar...
        O homem andava pelas calçadas cambaleante, como se estive fortemente embriagado, mas quem olhasse para ele com um pouco de atenção veria que isso não era verdade. Em meio a sua boca e barba loira, haviam manchas escuras de sangue, e alguns pedaços de carne fresca e crua. Seus olhos eram alaranjados e vazios, mas ao mesmo tempo astutos como os de um gato, e finalmente, se alguém olhasse para suas mãos veria algo híbrido entre mãos humanas comuns e garras bestiais, afiadas e sujas de sangue, cheirando à morte.
        Tinha recém se alimentado, mas não seria o suficiente. Aquele pobre cachorro não tinha o que realmente lhe agradava: sangue. Seu favorito era sangue humano, daqueles bem fresquinhos, saídos direto da “jarra”, que normalmente gritava nessa hora, o que lhe enchia mais ainda de prazer. Alguns o chamavam de vampiro, talvez não estivessem tão errados, afinal apesar de ele ingerir carne, seu verdadeiro alimento era o sangue dos outros seres vivos, mas que não viessem com cruzes, alhos, água benta ou coisa parecida, pensando bem, que viessem, pois seriam convidados de honra para o jantar.
        Até mesmo para o homem-vampiro era um mistério como ele poderia pensar tão lucidamente e ao mesmo tempo estar sendo controlado por aquela fome bestial. Mas não ligava mais agora, depois de se entregar aos prazeres do sangue, sentia-se o dono do mundo, livre de tudo aquilo que sempre o angustiou. Claro, ele sabia que isso era efeito do hormônio que se espalhava pelo corpo dele cada vez que perdia o controle. Talvez por isso gostasse tanto de perdê-lo. Dane-se que a vida era bela antes, agora era melhor! Aquela sensação era indescritível! Fazia todo o resto perder o sentido! Sua família, seus antigos amigos, eles não eram nada comparado àquela sensação maravilhosa! Pra que viver angustiado? (Será que ele realmente era angustiado antes?) Pra que obedecer as regras da sociedade? (Mas ele nunca se importou em obedecer...) Pra que tomar decisões complicadas sobre a vida quando se pode tomar SANGUE!?!? (Ele nunca preferiria ser uma marionete ao contrário de uma pessoa com vontade própria).
        Por um momento, recuperou o controle. Aquilo era loucura! Tinha de parar, ou ia acabar fazendo algo errado, matando pessoas, muitas delas. Mas a vontade era mais forte, a sensação era irresistível, era quase como uma droga (não era uma droga, afinal?). Então ele sentiu o cheiro, sim, aquele cheiro.
        Duas garotas vestidas com uniformes da escola estavam na frente do portão, fumando um cigarro cada uma. Uma era morena e alta, com o cabelo preso e as curvas bem torneadas, uma belezinha. A outra era menos bonita, mas parecia tão deliciosa quanto a amiga na visão do monstro. Aqueles pescoços branquinhos e delicados, cada vez que pulsavam, pareciam lhe convidar. Após soltar um guincho como o de um morcego, o homem se preparou para atacar e somente nessa hora, as garotas viram a monstruosidade que as cercava.
        Um pouco antes, a gasolina de Juan tinha acabado. Dentre todos os dias para ficar sem gasolina, por que logo esse!?! Ah, parecia que tudo conspirava contra ele... Mas de nada adiantava ficar reclamando desse jeito, decidiu ir a pé mesmo, e foi correndo, até chegar na frente da escola.
        Durante a caminhada, pôde ter seus últimos momentos de reflexão antes do confronto com o inimigo, que poderia significar sua desgraça ou sua redenção. Redenção pois até hoje ele se culpava pela morte de David, que caiu do alto de um prédio quando eles investigavam um falso atentado de terrorismo biológico. Tudo por culpa de uma das suas malditas visões, que estava errada. Normalmente, elas sempre acertavam, a não ser que ele as mudasse, como pretendia fazer agora, mas sabia que isso era algo muito raro de acontecer. Daniela, sua namorada e também cientista da organização, disse que o inimigo era uma aberração criada por engano no laboratório há anos atrás que recentemente tinha fugido.
        Ele riu, pensando que nem mesmo tinha conseguido ver a cara do tal monstro até agora, pois só o viu em perseguições noturnas. Porém logo calou seus pensamentos, pois se começasse a imaginar que a criatura tinha alguma humanidade, isso dificultaria seu trabalho um pouco.
        Foi nessa hora que ele ouviu gritos. Pareciam jovens mulheres gritando, oh não, ele tinha se atrasado! Foi correndo o mais rápido que conseguiu, vendo uma calçada totalmente ensanguentada e os corpos de duas jovens caídas ao chão, com seus pescoços dilacerados. Sacou suas duas pistolas e mirou no vampiro, atirando, mas errando os disparos, pois a criatura parecia ter uma velocidade sobrenatural.
        O homem correu para dentro da escola, seguido de perto pelos tiros de seu perseguidor. Os alunos que viam a situação ficaram chocados de tal forma que não sabiam se era melhor gritar ou simplesmente ficar pasmado olhando. Mas para Juan, isso cada vez menos importava, pois quando ele perseguia o inimigo, não via mais nada no caminho, nem futuro, nem passado, somente o alvo, olhando por esse ângulo, era um bom soldado.
        Somente quando seus tiros atingiram as costas do homem que eles pararam com a corrida desenfreada. E nessa hora, Juan viu algo que não simplesmente não acreditou. O homem maltrapilho de garras afiadas e cabelos loiros desgrenhados que estava à sua frente só poderia ser uma pessoa.
        Do outro lado, David também foi surpreendido, vendo que o homem que o caçava insistentemente era seu melhor amigo e ex-parceiro Juan. A vontade de matar dizia: “Tome seu sangue, sou seu único amigo agora”, mas ele não podia se dar por rendido, se ainda valia a pena viver para alguma coisa que não fosse tomar o sangue de todas aquelas crianças, era para falar uma última vez com ele, e talvez... talvez até mesmo... salvar sua existência.
        Juan não sabia se atirava ou o que faria a seguir. Afinal, David estava morto! O que ele via em sua frente só podia ser uma ilusão, não podia ser real, ele não queria acreditar que fosse! Mas tinha de perguntar, nunca mais dormiria em paz se não o fizesse:
        -...David... é você?
        A criatura rosnou e fez menção de atacar, somente para parar por um momento e dizer, com a voz fraca:
        -...Sim... Me... ajude...
        -Ajudar!?! Mas você... como?
        Ele já estava em desespero, pois seu instinto dizia para atirar e acabar com aquilo, mas sua razão pedia que ele parasse e ouvisse o que o amigo tinha a dizer.
        -Fizeram experimentos comigo... - agora ele parecia aos poucos ter conseguido voltar ao controle de si mesmo - A organização. Eles utilizam pessoas para experiências... ME SALVE!!!
        Aquilo foi um tremendo baque para o soldado Oliveira, sempre o melhor na organização. Eles eram os vilões da história!?!
        -E como posso te salvar?
        Um sorriso demente já pintava a cara do vampiro, que com um último suspiro disse:
        -Mate-me...
        Então a criatura criou asas negras de morcego e suas veias saltaram da pele, roxas e cheias de sangue. O vampiro havia atingido seu estágio final, e agora David estava para sempre morto. Nesse momento Juan teve mais uma visão, dessa vez a pior delas:
        Crianças mortas e manchadas de vermelho, salas de aula completamente destruídas, corpos mutilados, paredes decoradas com vísceras e sangue, e o corpo dele, Juan Oliveira ali, estendido no chão. Todos morreriam, e ele iria junto com eles. Agora tudo fazia sentido, ele iria falhar ali, morto pelo seu melhor amigo e todas aquelas vidas seriam sacrificadas em nome da fome de um monstro.
        A criatura já olhava para ele com olhos famintos, comemorando a vitória antecipada, pois sentia o cheiro de medo e de indecisão nele, e gostava disso, fazia o sangue ficar ainda mais saboroso! Porém, antes que ele pudesse investir contra sua nova jarra de sangue, sentiu uma de suas asas sendo perfurada por uma bala. Logo depois, outra, só que dessa vez no tórax.
        As pistolas de Juan ainda estavam fumegantes quanto ele gritou a plenos pulmões:
        -VOCÊ NÃO É MEU AMIGO DAVID!!! MORRA!!!
        Uma saraivada de tiros atingiram a criatura, que mal conseguiu se esquivar, manchando o chão com um sangue escuro e pastoso. Em seguida, ele saiu rasante pela escola, voando para tentar proteger sua vida. Mas não foi páreo para a espingarda de cano serrado do seu algoz, que o derrubou com um tiro certeiro nas costas.
        Certo de sua vitória, o caçador foi até seu velho amigo, se despedir uma última vez, quando este levantou-se rapidamente e lhe acetou no pescoço, fazendo o sangue jorrar de forma violenta. Juan simplesmente não conseguia acreditar que tinha sido derrotado assim, depois de chegar tão perto de salvar a todos. Aos poucos a vida foi se esvaindo do seu corpo, e as suas forças, diluindo-se na dor e na fraqueza. Era muito sangue perdido, ele nunca conseguiria levantar.
        Então, Juan Oliveira caiu, vendo a criatura aproximar-se para lhe sugar o sangue. Tudo estava perdido.
        Assim que o tiro da espingarda de cano serrado atingiu a besta, o futuro foi visto pelo caçador, mostrando como sua arrogância iria levá-lo a uma morte besta e prematura, nisso, ele deu mais um tiro, porém o vampiro se esquivou, fugindo para fora da escola. Toda aquela perseguição já estava irritando-o, ele queria somente matar o homem e poder se alimentar em paz.
        Do lado de fora, Juan foi emboscado, e atacado pelas costas, algo que ele não conseguiu prever, mas mesmo nessa situação, seu instinto de caçador foi mais forte e o golpe quase não o machucou, já que ele usou sua arma para se defender. Depois disso, ela tinha virado um simples cano retorcido, inútil. Bem, tinha sido uma boa companheira por longos anos, mas agora lamentações não adiantavam mais. Logo, ele pegou as duas pistolas, e começou a atirar como louco, somente para ver seu antigo amigo desviar de todas as balas, e ainda investir contra ele. Após uma esquiva, ele derrubou seu par de armas no chão, no que o monstro se colocou entre ele e elas, rugindo de forma feroz e maligna.
        O que o vampiro não sabia, era que Juan ainda tinha um revólver guardado, e com este, ele deu um tiro certeiro na cabeça do inimigo, fazendo cair para trás, retorcendo-se em dor e virando um pus escuro e malcheiroso. Caído na calçada ensanguentada, Juan gargalhou de felicidade. Até o último momento, David estava ali com ele. Isso porque há dois anos atrás, ele lhe deu aquele velho revólver de presente, dizendo que tinha “achado a cara dele”. Seu sorriso foi substituído pela dor, quando ele viu que seu ombro e braço direito estavam sangrando, devido ao ferimento de antes. O revólver ainda estava quente quando ele se levantou, e olhou para o corpo macabro do amigo. As pessoas iam logo aparecendo, todas curiosas, querendo saber o que era aquilo e quem era o suposto herói que tinha combatido aquela monstruosidade alada.
        Mas Juan simplesmente saiu andando e ignorou a todos. Ele não queria saber do que aconteceria se as autoridades descobrissem o corpo, não ligava a mínima para o que pensavam sobre ele, simplesmente andava, sempre em frente, pois agora ele tinha uma motivação nova.
        Uma missão que somente ele poderia cumprir: Se vingar dos malditos que modificaram David, fazendo-o passar por tudo aquilo. E Deus quisesse que Daniela não tivesse nada a ver com isso, pois nem ela nem Ele o impediriam em sua missão, agora.
        O homem seguiu solitário pelas calçadas ensanguentadas, pensando em seu futuro.

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